domingo, 4 de marzo de 2012

AVANÇOS RECENTES NA RELAÇÃO BRASIL-CUBA.



Autor:Alexis Toríbio Dantas[1]
 
Seguindo a política externa adotada, sobretudo, a partir do início do primeiro governo Luís Inácio Lula da Silva em 2002, o Brasil vem estreitando, no período recente, os laços cooperativos com o Cuba, tanto no que se refere aos investimentos estrangeiros diretos quanto na busca por elevar a corrente de comércio com aquele país. Em visita a Cuba em janeiro último, a Presidente Dilma Russef avançou significativamente na composição de acordos econômicos que podem se tornar fundamentais para as reformas pretendidas na ilha. Neste processo, os principais destaques observados são:

  1. Estimular o desenvolvimento de uma “zona de livre exportação” em Cuba, com financiamento das obras de (re)construção e modernização do Porto de Mariel através da construtora brasileira Odebrecht.
  2. Expansão da refinaria de petróleo Cienfuegos.
  3. Abertura de linhas especiais de financiamento e aproximação com dirigentes de entidades classistas empresariais brasileiras (como a FIESP) e de instituições de fomento ao comércio.
  4. Investimentos no setor açucareiro também pela empresa Odebrecht em associação com a estatal cubana do setor.

No que se refere ao Porto de Mariel, Brasil e China serão responsáveis pela maior parte do financiamento e a ideia é torná-lo um dos maiores terminais da América Latina. Importante destacar a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do Brasil com a Odebrecht, reforçando o papel do Banco de estímulo à internacionalização das empresas brasileiras na direção de integração e cooperação sul-sul da política externa brasileira nos últimos anos. Além da reforma de mais de 30 km de estradas e a construção de mais de 60 km de estrutura para ferrovias, estão previstos cerca de 20 km de acesso rodoviário entre outras melhorias. As obras de dragagem, fundamentais para o acesso de navios de grande calado, permitirão a movimentação de aproximadamente um milhão de contêineres por ano.

Junto às obras do Porto, pretende-se também criar uma zona de livre exportação. Neste contexto, foi estabelecido, concomitantemente, um convênio visando à criação de uma fábrica de medicamentos com recursos brasileiros e tecnologia desenvolvida em Cuba, com atenção especial para a produção de medicamentos anticancerígenos[2]. Vale citar ainda a expansão da refinaria de petróleo Cienfuegos buscando ampliar a produção atual de 65.000 barris para 150.000 barris diários.
No intuito de estimular as relações comerciais entre Brasil e Cuba, o governo brasileiro comprometeu-se a abrir uma linha de crédito de US$ 350 milhões para financiar a compra de alimentos por Cuba, utilizando para isso o Programa de Financiamento à Exportação (ProEx). Ademais disso, acordou-se a abertura de outra linha de crédito de US$ 200 milhões, nesse caso a partir da Câmara de Comércio Exterior (Camex), para o programa Mais Alimentos. O objetivo é facilitar a aquisição de equipamentos e insumos para a agricultura. Pelo lado cubano, o ministro de Comércio Exterior e Investimentos Estrangeiros, Rodrigo Malmierca, enfatizou a mudança na legislação permitindo a cessão em comodato de áreas para a construção de empresas e hotéis por 99 anos, renováveis indefinidamente. Considerando estas oportunidades, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), Paulo Skaf, garantiu a participação da entidade na próxima Feira Internacional de Havana, em novembro próximo, onde 42 empresas brasileiras vão expor seus produtos.
 
Uma mudança marcante, todavia, refere-se à entrada do conglomerado brasileiro Odebrecht para a produção de açúcar em Cuba, tornando-se o primeiro investimento de capital estrangeiro no setor açucareiro na ilha desde 1959. Através da COI (Companhia de Obras em Infraestrutura), subsidiária da Odebrecht em Cuba, a empresa firmará acordo com a estatal Azcuba para a administração produtiva da usina 5 de Septiembre em Cienfuegos, centro de Cuba, prevendo uma associação de 10 anos para incrementar a capacidade produtiva de moagem e revitalização da usina[3]. Com forte atuação no setor de bicombustíveis no Brasil, a Odebrecht é uma das maiores produtoras de etanol no país, e sua entrada na economia cubana certamente tomará esta direção, além da produção de energia a partir de biomassa. Empreendimento semelhante é realizado pelo conglomerado brasileiro em Angola, através de uma joint venture, indicando, portanto, uma estratégia global da Odebrecht. Desta forma, a produção enquadra-se, do ponto de vista estratégico, na elevação da capacidade de exportação de etanol pela empresa, embora haja um longo processo de investimento necessário para recuperar a capacidade produtiva em Cuba (grande parte das terras está, há longo tempo, abandonada).

Em todos os aspectos envolvidos no estreitamento das relações produtivas e comerciais Brasil-Cuba, cuja execução caminha a passos largos, um ponto chave pode ser o fim do embargo comercial norte americano à ilha, o que realçaria a posição geográfica privilegiada de Cuba como uma zona de exportação.


[1] * Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ).

[2] A construção de uma fábrica produtora de vidro também está em pauta, mas nesse caso em uma área fora do Porto de Mariel, pois estas obras só estarão finalizadas, de acordo com a previsão atual, em 2014. A fábrica brasileira de vidro Fanavid será a responsável pelo empreendimento, em associação com o governo cubano, e o objetivo é destinar cerca de 80% da produção para o mercado internacional.
[3] Cabe salientar que a produção cubana caiu de cerca de 10 milhões de toneladas em 1970 para pouco mais de um milhão de toneladas na última safra.